Ziriguidum no Século XXI – Parte 03

0
tijuca2010f

(2010 – 2014) Novas Ousadias numa Senhora Festa

No terceiro post desta série, voltamos aos primeiros anos da segunda década do século XXI, em que novas revoluções surgiam (em passe de mágica) na passarela do Samba; passarela esta que recebeu uma ampla reforma em 2012; fase em que o quesito samba-enredo ressurgiu com força; e continua a velha diáspora entre as novidades e o tradicionalismo na folia.

Os Segredos de Paulo Barros

Em 2010, Paulo Barros retornava à Unidos da Tijuca, escola que o revelou para o grande público. Muitos segredos rondavam esse desfile. Não só porquê os segredos da humanidade seria o enredo do desfile, mas porquê havia realmente muito mistério sobre quais seriam as loucuras apresentadas pelo carnavalesco do século. Sabia-se do abre-alas que representaria a Biblioteca de Alexandria pegando fogo e do segundo carro sobre os Jardins da Babilônia feito com plantas de verdade. Mas ninguém sabia do ápice desse desfile, que foi a comissão de frente coreografada pelo casal Priscila Motta e Rodrigo Negri, em que as roupas das bailarinas trocavam em segundos num passe de mágica.

O sucesso dessa comissão de frente mudaria os rumos dos futuros trabalhos nesse quesito, em que o fator surpresa, se tornou imprescindível para o bom desempenho do desfile. O problema foi os exageros que surgiriam nos anos seguintes. A famosa comissão da troca de roupas alavancou o desfile de uma Tijuca que era somente a terceira escola de domingo e que conquistava um título no grupo especial que não ocorria há mais de 60 anos. Nos anos seguintes, Paulo Barros e seus desfiles hollywoodianos chamavam ainda mais a atenção do público e da imprensa. Mas não podemos esquecer que a Tijuca era uma escola de quesitos e muito bem defendidos. E mesmo não sendo brilhantes, Paulo Barros e Tijuca conquistaram mais dois títulos: em 2012, homenageando o centenário de Luiz Gonzaga, e 2014, com o tema sobre a velocidade.

O Que Vale Título: Novidade ou Tradição

No mesmo ano de 2010, a Grande Rio ficava com o segundo lugar  resgatando os grandes desfiles da história de 25 anos da Sapucaí, exaltando, por exemplo, tanto o tradicionalismo de Arlindo Rodrigues e Rosa Magalhães, como as novidades feitas pelo próprio Paulo Barros. Outro homenageado nesse desfile foi o carnavalesco Joãosinho Trinta, que fazia sua última passagem em vida pelo sambódromo no carro que lembrava o histórico desfile da Beija-Flor de 1989. O carnavalesco faleceria em dezembro de 2011.

Nesse ano, a modernidade foi melhor que o tradicionalismo.

Mas nem sempre as revoluções de Barros resultavam em título. Em 2011, naquele que considero o desfile mais Paulo Barros de todos os tempos, tantas surpresas nos carros e um enredo mais popular e confuso, sobre o medo presente no cinema, não foi o suficiente para derrotar a Beija-Flor com sua velha comissão de carnaval, desfile “certinho” e também com um enredo popular: homenagem ao cantor Roberto Carlos. Para quem pensa que carros e comissões de frente cheias de surpresa ganham carnaval, deveria se lembrar que em 2013, a simplicidade da vida na zona rural rendeu à Vila Isabel o seu terceiro campeonato. Nesse ano, a Vila era o oposto da Tijuca, com um desfile esteticamente mais tradicional e com um samba-enredo antológico.

O Resgate do Quesito Samba-Enredo

Em 2013, o Palco do Samba se transformava em uma Festa no Arraiá. Através de um experiente partideiro e de mais alguns parceiros de mão cheia, a Unidos de Vila Isabel levava um dos sambas mais populares deste século, graças a um refrão simples, mas inesquecível: “Festa no Arraiá, é pra lá de bom, ao som do fole eu e você, a Vila vem plantar(colher), felicidade no amanhecer”.

A Portela foi outra salvadora da Pátria do Samba. Ela própria vinha em 2010 e 2011 com os piores sambas do seu rico repertório. Mas em 2012, celebrando as festas da Bahia, a escola resgatou um estilo de samba mais antigo, com três refrões e isso ajudou-a fazer um desfile de encontro às suas raízes.

A escola continuaria nessa linha de sambas em 2013 e 2014. Menção honrosa para o samba do Salgueiro de 2014 e para a Mangueira em 2011. Aliás, esse último samba, não foi aprovado pela torcida quando foi escolhido na final de sambas. Precisou do então presidente Ivo Meirelles recitá-lo para que os mangueirenses entendessem a beleza da obra que homenagearia os 100 anos do compositor Nelson Cavaquinho. E de fato, o samba é lindo.

Ainda em 2011, além do samba, a verde-rosa  fez um paradão de 40 segundos dos instrumentos da bateria e do carro de som. Porém, em 2012 o paradão ficou ainda maior, durou uma passada inteira do samba e coube aos componentes e espectadores segurar o samba no gogó. Apesar desse artifício ousado, a Mangueira nem chegava perto de brigar por títulos devido ainda à crise financeira que enfrentava desde 2008 e a erros de cálculo nas alegorias, como o da libélula do último carro presa na torre de TV e do pajé decapitado pela mesmo obstáculo em 2014.

A Volta das Primas Sapecas

Depois de anos sem nenhuma variação do grupo de escolas na elite, a União da Ilha voltou para ficar no grupo especial. O desfile desenvolvido por Rosa Magalhães sobre Dom Quixote e uma péssima exibição da Viradouro (rebaixada nesse ano), fizeram a agremiação insulana continuar no grande grupo. Nos anos seguintes, a escola provou que sua permanência não foi por um acaso, graças ao talento do carnavalesco Alex de Souza que fez trabalhos condizentes com o estilo da Ilha, como o mágico desfile dos brinquedos em 2014 que vale a pena se deliciar com a estética colorida e com um enredo que resgatou  lembranças de infância.

No caso da São Clemente, a permanência dela contou com o acaso. Como em 2011 não haveria rebaixamento, a escola ganhou mais um ano na elite. Foi então que a famosa escola cai-cai fez uma leve e empolgante exibição sobre musicais e para não cair de novo. Apesar dos jurados sempre a perseguirem, deixando a São Clemente em décimo primeiro, uma posição acima das escolas rebaixadas. Entre elas, a Porto da Pedra, escola que vinha merecendo cair ao longo dos anos, mas sacramentou sua temporada ruim no grupo especial com um desfile sobre o iogurte?!

Incêndio na Cidade do Samba 

Na manhã de 07 de fevereiro de 2011, o carnaval entrou em luto com o incêndio nos barracões da Portela, União da Ilha, Grande Rio e no departamento cultural da LIESA, há 27 dias dos desfiles. Das três, a Grande Rio foi o que a teve o carnaval mais perdido. A escola perdeu cerca de 95% de tudo o que já fora feito e brigaria com força pelo campeonato, com um enredo patrocinado sobre Florianópolis. Se não fosse o incêndio. Portela e Ilha também tiveram grande prejuízo.

Por causa disso, a Liga decidiu que não haveria rebaixamento para nenhuma escola (por isso a São Clemente permaneceu) e essas três desfilariam por hour-concurs. Se a Grande Rio lamenta o desfile campeão que virou cinzas, a União da Ilha fez uma exibição de muita valentia e bom gosto estético e narrativo, contando a evolução das espécies pela teoria de Darwin, o que lhe rendeu o estandarte de ouro de melhor escola do ano pelo jornal O Globo. Se estivesse concorrendo, certamente a Ilha voltaria no Sábado das Campeãs.  Já a Portela não estava com tantas condições para fazer um grande carnaval antes do incêndio sobre o mar e o Porto Maravilha.

Reforma no Sambódromo

O projeto de Sambódromo da cabeça do arquiteto Oscar Niemeyer se fez real. A ideia original começava a ser realizada em julho de 2011, no período de grandes reformas na cidade do Rio de Janeiro visando a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. Onde existia a Fábrica de Cervejas, que foi demolida, se ergueu um novo setor 2, novos camarotes,novas frisas, tudo novo, deixou a beleza do palco do Samba ainda mais bonito, que ganhou um aspecto de espelhado no piso o que abrilhantou ainda mais a festa. Pode-se dizer que esse foi uma última homenagem em vida para o arquiteto Oscar Niemeyer que viria a falecer no final de 2012.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *