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Por Claudine Varela

A humanidade está impedida de estabelecer contato físico, como fazia antes, desde dezembro de 2019. Essa impossibilidade começou pela China e foi se espalhando pelo resto do mundo, junto com a COVID19. Com isso, os seres humanos se voltaram ainda mais para o contato virtual, no intuito de satisfazer suas necessidades sociais.

Entretanto, especialistas dizem que o contato físico é de extrema importância para o desenvolvimento emocional. A psicanalista Constança Hertz relata que “A pele, ao início da vida, é muito importante para o bebê se sentir acolhido e cuidado. O toque, portanto, desde o início da vida tem importância central.”

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Mesmo nas sociedades em que as pessoas se tocam menos ele é importante. Não por acaso, com certa frequência, surgem pesquisas que lembram da importância do abraço, algumas medem, ainda, o tempo necessário para que ele traga a sensação do acolhimento.

Os seres humanos também têm uma comprovada capacidade de adaptação e buscou, durante essa pandemia, intensificar o contato, tão necessário, de outra maneira, através das redes. Até para reuniões familiares e comemorações de aniversário os aplicativos de bate-papo e chamadas de vídeo nunca haviam sido tão utilizados. Ainda segundo Constança, “a ausência do toque vem como um novo aprendizado. Afinal de contas, a qualidade das relações deve se manter mesmo sem o toque”.

 

E que qualidade seria essa? Há muitos relatos, inclusive de pessoas públicas, sobre a redescoberta da importância do outro em suas vidas, sendo eles outros humanos, animais domésticos, o meio ambiente… Enfim, o outro pode ser visto de forma bem ampla, pois essa consciência de sua existência, e até de sua necessidade, representa um menor espaço para o individualismo na sociedade. Mas isso é, de fato, possível nesse modelo de organização social do mundo de hoje?

Boaventura de Sousa Santos, em texto publicado (29/07/2020) no site Outras Palavras, afirma que o “homo economicus (o homem económico) do capitalismo nascente, tal como o quase contemporâneo homo lupus homini (o homem lobo do homem), de Hobbes, são a expressão desta desumanização do humano. O ser competitivo, centrado no seu interesse individual, é um ser anti-social que vê nos semelhantes (nunca iguais) potenciais inimigos e que só faz filantropia se dela resultar benefício próprio”.

Estando todos inseridos em um mundo capitalista, esse individualismo seria realmente deixado de lado? O outro, que pode ir da pessoa em situação de rua aos animais resgatados, é importante por ser o outro ou porque nos faz bem acreditarmos que lhe damos importância? E nisso podem estar inseridas as doações em dinheiro, a distribuição de alimentos, a adoção de animais e as vídeo chamadas comemorativas. Quanto disso fazemos para consumir o que esse outro pode oferecer, satisfazendo nossas necessidades individuais, e quanto disso estaria voltado para se pensar e começar a construção de uma nova realidade, marcada por um pensamento de coletividade? Um pensamento, de verdade, social.

Aí voltamos à qualidade das relações. Quando pensamos no outro, damos mais valor ao que diz a ciência, em relação às formas de contaminação nessa pandemia, ou à vontade de sair com os amigos? Ao uso das máscaras e aos protocolos de higiene para que o Coronavírus não se espalhe ou ao incômodo que respirar dentro da máscara pode trazer e todo o trabalho que dá higienizar as mãos e manter o distanciamento físico de outras pessoas? O que é, efetivamente, qualidade de relação entre mim e o outro?

Será que não nos sentimos autorizados, a todo instante, pelas atitudes e decisões políticas e econômicas dos principais representantes mundiais, a sermos mais individualistas e pensarmos menos como um grande coletivo? Mesmo atravessando “juntos” essa crise causada pela pandemia? Ainda nos diz a psicanalista que a “ausência de reflexão sobre as contradições sociais que enfrentamos perpetua uma sociedade que segue sendo cada vez mais injusta”. Será essa a sociedade e a qualidade que seguiremos querendo para nossas relações?

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