As Primas Sapecas do Samba
Livro exalta a relevância crítica, irreverente e pueril das escolas de samba Caprichosos de Pilares, União da Ilha e São Clemente.
Há cinco anos, era lançado o livro “As Primas Sapecas do Samba – Alegria, Crítica e Irreverência na Avenida”, com 36 crônicas que contam histórias curiosas sobre três escolas de samba do Rio de Janeiro que conquistaram uma legião de apaixonados com desfiles leves, irreverentes e ousados ao invés do luxo e da grandiosidade de escolas mais tradicionais. São elas: União da Ilha, São Clemente e Caprichosos de Pilares. Esse produto faz parte da série “Família Carnaval”, que conta com outras três edições, lançadas a partir de 2012, organizadas pelo jornalista Fábio Fabato que explicou o porquê de transformar essa paixão em livros:
“A Série Família do Carnaval foi criada com o objetivo de trazer as histórias de bar, as histórias de bastidores, da formação de diversas escolas de samba que ainda não tinham suas histórias retratadas e não tinham seus personagens trazidos para o público (…)”.
Para escrever essas histórias, Fabato convidou outros três jornalistas que tenham ligação íntima com essas agremiações: Vicente Dattoli, sobre a Caprichosos, Eugênio Leal, sobre a São Clemente, e Anderson Baltar, sobre a Ilha. Esse último relatou sobre a importância da Tricolor insulana nesse grupo: “A União da Ilha, de certa forma, é precursora das Primas Sapecas, porquê foi a primeira dentre as três que chegou ao Grupo Especial e chegou imprimindo uma marca e do trabalho que a Maria Augusta fez na Ilha do Bom, Bonito e Barato, do que ela sempre chamou de luxo da cor (…) então a União da Ilha se torna uma escola colorida ao contrário das adversárias e com temas lúdico quando até então, os temas históricos predominavam”
Principalmente entre as décadas de 1970 a 1990, essas três deixaram marcas bem definidas no passado dessa festa, que foram narradas nas 224 páginas do livro. Como o desfile de 1977, da União da Ilha sobre o domingo no Rio de Janeiro, que trazia elementos típicos desse dia, com um samba antológico e um visual desenvolvido com maestria pela carnavalesca Maria Augusta, lembrado com carinho por Baltar:
“A União da Ilha marcou o carnaval com ‘Domingo’. É um desfile revolucionário, é um desfile antológico, era uma avalanche, uma coisa que só se repetiu anos depois com o ‘Ita’ no Salgueiro de 1993. A comoção do público, a fluência do desfile, um samba belíssimo, então eu acho que a União da Ilha marcou ali “
A Caprichosos de Pilares promovia críticas em tom de irreverência, e com sambas nada politicamente corretos, como esse de 1985, cujo refrão dizia: “Tem bumbum de fora pra chuchu/Qualquer dia é todo mundo nu”. Até hoje, o enredo “E Por falar em Saudade…” é considerado o desfile mais lembrado da sua história.
Já a São Clemente, nos anos 80, utilizava a crítica de uma maneira mais ácida, abordando temas sérios como os moradores de rua, os problemas de saúde e habitação no país, e até o próprio desfile de escolas de samba não foi poupado no enredo “E o Samba Sambou?”de 1990 quando obteve seu melhor resultado – sexto lugar.
Esse detalhe denota um vício de como elas são vistas pelo público e pelos julgadores do carnaval. Nenhuma das três foi campeã e não foram além de um terceiro lugar (Ilha em 77 e 89). Essa avaliação é muito criticada por Fábio Fabato: “Historicamente, o carnaval acabou se pautando por um rigor estético que não foi propriamente uma marca das primas sapecas (…) e elas resolveram brilhar sobre uma outra perspectiva, não necessariamente de beleza estética mas de pujança temática e o júri acabou não premiando essa característica, talvez por um falha do próprio júri (…).
Cinco anos depois da publicação desse livro, essas três escolas se encontram em divisões diferentes do carnaval: a São Clemente vai para seu décimo primeiro desfile seguido no especial, algo que parecia impossível para ela; a Ilha, terminou em último no carnaval de 2020 e vai disputar a primeira divisão do grupo de acesso. Já a Caprichosos passou dois anos sem desfilar por conta de uma gravíssima crise financeira. Porém, em 2020, a escola ressurgiu e foi campeã do Grupo de acesso D. Para o responsável pela obra, essas três escolas tem um papel fundamental na história dos desfiles que somente elas podem assumir: Ir além da beleza:
“São escolas ricas, sim, mas no aspecto da criatividade, nos elementos que se tira da cabeça que não se tira do bolso, elas criaram uma revolução não estética, mas temática, sempre com propostas alternativas, vendo a vida com olhos de crítica, picardia, de pimenta, por isso que são as Sapecas”, declarou Fábio Fabato.