Bate Papo com o cantor e compositor ALCEU VALENÇA
ALCEU VALENÇA aproveita a pandemia para recriar canções que se tornaram clássicos em 03 novos álbuns.
Quatro décadas depois de gravar seu único disco no formato voz & violão (o Lp Saudade de Pernambuco, 79), o cantor e compositor Alceu Valença aproveitou o período de quarentena para gravar 03 novos álbuns, sendo que o 1º foi disponibilizado na última sexta feira, dia 12 de março/2021, nas plataformas digitais.
Nas 11 faixas desse trabalho, Alceu recria canções que se tornaram clássicos como “Ciranda da Rosa Vermelha”, “Estação da Luz”, “La Belle de Jour” e “Táxi Lunar” e faz releitura de músicas menos conhecidas de sua obra, entre as quais “Beija-flor Apaixonado”, “Iris”, “Marim dos Caetés”, “Mensageira dos Anjos”
Algumas delas entraram no repertório por solicitação de fãs do artista pernambucano. Não por acaso, o lançamento ocorreu na data de aniversário de Recife e Olinda, duas das matrizes sonoras do compositor.
O que a princípio seria um álbum simples, acabou por tornar-se uma série de lançamentos digitais. Durante a quarentena, Alceu Valença, com a conhecida inquietude, se ateve à sua obra e de lá selecionou algo em torno de 30 composições — canções, sambas, xotes, maracatus, cirandas e frevos de bloco —, para o set list dos três discos, produzidos por Rafael Ramos. As gravações foram feitas entre novembro e janeiro últimos, no estúdio da Deck Disc, selo responsável pelo lançamento.
Que tal um bate papo com Alceu Valença?
Você sempre teve o acompanhamento de banda para gravar disco. O que o levou a gravar um álbum de violão e voz?
Com o advento da pandemia, estou isolado em casa, aqui no Rio, com minha mulher Yanê, desde março. Nunca mais apertei a mão de ninguém. Então passei a ocupar o tempo tocando violão. Desde que me entendo como músico, cantor e compositor, nunca toquei tanto violão como durante esta quarentena. Mas só posso fazer isso à noite, pois a interminável reforma de um apartamento vizinho, não me permite me concentrar durante o dia. Foi aí que passei em revista minha obra, criando outra versão, outra sonoridade para as músicas que compus ao longo da carreira.
Aí surgiu a ideia do disco?
Inicialmente eu pensava em gravar um disco. Mas foram tantas músicas revisitadas que acabei decidindo por uma série de três. Ao primeiro, que está sendo lançado pela Deck Disc, dei o título de “Sem Pensar no Amanhã”, um samba inédito composto neste período de recolhimento. Os outros dois, já gravados, sairão depois.
Já havia gravado disco neste formato?
Gravei apenas um, em 1979, quando passei temporada de um ano em Paris, mais precisamente no Quartier Latin. Lá, como tenho feito agora, vivia com violão nas mãos. Tocava diariamente. Longe da minha terra, mas a mantendo na mente, gravei o LP “Saudade de Pernambuco”, só de voz e violão. O Paulinho Raphael, guitarrista da minha banda, apareceu por lá e participou do trabalho.
Qual foi o critério para a escolha das músicas?
Como faço sempre em meus discos e nos shows, criei um roteiro para este álbum, como se fosse para um filme, com uma música conectada com a outra. Cada um dos três discos gravados para este projeto, tem sua história. No “Sem Pensar no Amanhã” imaginei voltando ao Marco Zero de Recife e às ladeiras de Olinda durante o carnaval, cantando xote, frevo, maracatu e ciranda no bloco Pitombeira, que tem sede atrás da minha casa.
A música que dá título ao álbum é um samba. Você já havia feito composições com este ritmo?
Fiz poucas. A primeira que gravei, porém, não era de minha autoria, um samba-choro chamado “Candango Sofredor”. Foi composto por Rinaldo Valença, um tio que vivia em Brasília. Mas gravei num disco dele.
Como artista andarilho, está com saudade da estrada?
Durante muitos anos, o lugar onde menos fiquei foi na minha casa, no Rio, pois estava sempre na estrada. Aliás, depois dos três discos do projeto, tenho um outro para lançar intitulado “Senhora Estrada”, em que falo de minhas andanças pelo país e o mundo. Por causa da pandemia, deixei de fazer duas turnês em 2020: uma, de 45 apresentações pelo Brasil, do começo de março a junho; e outra, em seguida, de 16 apresentações pela Europa. Adiei as duas turnês para este ano, mas tive que adiar novamente, para 2022. É claro que estou angustiado e ansioso para voltar a fazer shows, mas é necessário se aquietar e esperar que as coisas voltem ao normal, tanto aqui quanto no mundo.
Está ansioso para vacinar?
Claro. Estou com 74 anos, sou do grupo de risco. A vacina pode vir de onde vier. Pode ser de Oxford ou da Cochinchina, desde que seja aprovada pela Anvisa, que estou com o braço pronto para recebê-la. A princípio devo me vacinar na próxima segunda-feira (dia 15 de março/2021).
Pelo visto tem muita gente que não está preocupado com a covid-19?
Moro no Leblon e, daqui do meu apartamento, dá para ver a Praça Cazuza, próxima à Rua Dias Ferreira, cheia de bêbados irresponsáveis, muitos sem máscara que, pelo visto, acreditam estarem imunes ao contágio.
Artistas de diferentes áreas padecem sem recursos até para sobreviver, por falta de incentivo à cultura vindo de órgãos governamentais. Você tem sido solidário aos seus companheiros de ofício?
Vejo claramente como esta situação tem afetado os artistas, principalmente as pessoas que atuam fora do palco. Os músicos e o pessoal da técnica, que trabalham comigo, não têm vínculo empregatício, mas busco ajudá-los neste período em que estamos sem atividade. Fiz uma live, com renda revertida para a União Brasileira de Compositores (UBC). Acredito que outros colegas estejam fazendo algo semelhante. Ouço pessoas ligadas ao governo falar mal de artistas que faziam uso da Lei Rouanet. Nunca me utilizei dessa possibilidade, mas a lei foi criada para ser utilizada por quem necessita.